quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Carta ao desconhecido


Prezado Senhor Desconhecido,

Imagine-se no meu lugar.
Imagine-se vivendo a minha vida.
Imagine-se sonhando os meus sonhos.
E agora me responda: é justo que detenhas tantos segredos preciosos e os mantenha afastados de mim?

Sou uma simples alma que conhece tão pouco sobre si, imagina sobre os outros e sobre o mundo! Enquanto tu, ó Desconhecido, abrigas todo o resto que não sei, e que muito do qual provavelmente nunca saberei!

Como podes ser tão insaciável?
Devoras com fervor toda a história que já foi e guardas contigo toda a existência e fatos futuros de todos nós. Não se contentando com uma única possível maneira de escrever a história, provavelmente passas o tempo a criar novas possibilidades, infinitas possibilidades, para o que deve ainda ser, e as mantém secretas, longe dos olhos de todos nós, aqueles que sentirão na pele os efeitos futuros.

Como podes ser tão egoísta?
Detém tanto contigo e não compartilhas! O pouco que compartilhas, espalha entre os seres humanos do mundo inteiro, garantindo que seja muito difícil que as peças do quebra cabeça maior sejam unidas. Ah! Quanta mesquinhez! Que maneira perversa de tratar o conhecimento desconhecido, tornando-o conhecido a poucos e segregados seres!

Como podes ser tão obscuro?
Já não bastasse esconder tudo contigo, ainda necessitas incitar-nos a dúvidas e divagações sobre tudo, inclusive sobre o já conhecido? Pior: te atreves a invadir a minha própria existência e tornar todo o meu processo de auto-aprendizado mais e mais difícil! Como és capaz de tamanha intromissão! Deténs os segredos para o meu conhecimento interno, e os esconde em lugares impossíveis de imaginar!

Escrevo-te em revolta. Em revolta por tornares esse processo de aprendizado e conhecimento mais difícil. Mais complicado. Mais complexo. Escrevo-te sem esperanças de que me respondas e sabendo que tu rirás muito, pois já esperavas a chegada dessa carta a tantos anos atrás. Mas escrevo mesmo assim, motivado por uma indignação com o monopólio do desconhecido.

Não espero que tomes nenhuma ação. Sei que tu sabes mais do que posso imaginar, e que tua forma de agir tem suas lógicas, e assim não vou esperar que me reveles o mundo em um instante. Não vou sequer esperar que me deixes descobrir quem eu sou. Não vou esperar nada de ti, simplesmente porque não posso confiar minha paz a quem mantém tanto mistério e segredos. Não. Espero somente que essa carta me faça refletir e descobrir a tua razão maior de existir. Pois se descubro essa verdade, todas as outras virão com ela...

Não! Recuso-me a jogar teu jogo mesquinho! Prometo-te: não vais agonizar mais minha existência. Pois viverei na esperança de que tudo sempre será o que tem de ser, não importa o que.

Não, Desconhecido, sinceramente eu não me importo mais. Guarde tudo para si e seja feliz. Só preciso de um pouco de paz de espírito e muita serenidade, e nunca mais lembrarei do que me escondes.

Desconhecido, adeus. E até nunca mais.

De seu há tanto já conhecido



PS: outro texto vindo da noite. Após duas horas tentando dormir sem sucesso, me veio uma vontade estranha de escrever. Não me senti inspirado. E o texto demorou um pouco para sair. E agora que está pronto, não sei se gostei muito dele não. Aliás, não sei nem se gostei. Não me desperta emoções (talvez desperte sim: apatia). Mas vou postar: desejo mostrar como o processo de criação muda de acordo com as motivações e sentimentos internos. Bom, muitos leitores não vão perceber nada, talvez só eu mesmo, como o escritor. Fato é que esse texto tem um cunho diferente dos demais. E vai pro ar para me lembrar as diferentes formas em que ideias podem sair...

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